Comunistas e capitalistas, senhoras e senhores, bandidos e policiais, ferraristas e minardistas, vascaínos e rubro-negros, Verissimos e Dapieves... é chegada a hora! Todos unidos numa só voz. Não dá mais para adiar. A língua portuguesa, carente, carece imediatamente dele. O esperado. O prometido. O necessário. Ponto de Ironia!Só o Ponto de Ironia para dar um jeito nesse país. A criatividade brasileira está sendo varrida para o ralo sem ele. Se você ainda não entendeu esta ironia, não tema nem se sinta menor ou culpado, afinal o Ponto de Ironia ainda não existe. Abaixo a explicação. Ou pelo menos a tentativa.A questão é mais antiga do que o rascunho da Bíblia. Como professor em faculdade de jornalismo, como repórter, como leitor, sempre foi duro, estressante e frustrante enfrentar este monstro pegajoso. A ironia. Uma relação paradoxal e complexa. Queria usá-la a torto e a direito, mas o herói da compreensão, o mocinho cartesiano, imediatamente abatia o terrível monstro. “Não entendi o teu texto”, “Muito bom o teu texto”, “Você é muito sarcástico, parabéns”, “ Você gostou mesmo daquele filme horrível?” eram algumas das reações para os malfadados textos irônicos. Sem o redentor Ponto de Ironia, todos eles eram incompreensíveis.Claro! Ninguém é obrigado a entender as ironias de qualquer autor pretensamente irônico. A vida é pão pão queijo queijo. Se assim não fosse, Hollywood não faria tanto sucesso com seus filmes fáceis. Mas o povo quer mudanças! Basta da supremacia do óbvio! Gramáticos de todo o país precisam se unir! Estamos diante de uma oportunidade única, tantos são os artigos descascando a ignorância e a petulância norte-americana.Chegou a hora, o momento da revolução, do fim dos mal-entendidos, da sensação magnânime da ignorância. Isso tudo vai acabar.Que seja criado imediatamente o Ponto de Ironia! Temos o de exclamação para que as palavras gritem. O de interrogação, sempre perguntando. As vírgulas, paramédicas, ajudando na respiração do leitor. Fora as constantes reticências, reflexivas, mas meio assim Maria-vai-com-as-outras. Não esqueçamos do burocrático ponto-e-vírgula, sempre em cima do muro, mas cumprindo seu papel.Como seria o Ponto de Ironia? Poderia ser um “i” de cabeça para baixo. Ou um “i” entre parênteses. Ou um “i” deitadinho, com uma expressão de que comeu e gostou. Ou uma dessas carinhas infantis usadas por adultos nas mensagens entre um computador e outro. Mas qual das carinhas seria a melhor? Uma matreira...;) ou raivosa : ( ou encucada, de bigode ={0 . É assunto para os lexicográficos. Enquanto eles pensam, provisoriamente, para efeito de compreensão imediata, usaremos o i entre parênteses. Aí está, como uma Medida Provisória da língua portuguesa, baixada pelo sapo de faixa. O Ponto de Ironia: (i)!Ficou parecendo com o símbolo que adorna balcão de informações nas rodoviárias e aeroportos. Para melhor compreensão da ironia, o PI, Ponto de Ironia, deve vir antes das frases onde a derme quer dizer uma coisa, mas a alma quer dizer outra, exatamente o contrário. Senão vejamos. (i) Bush quer matar o último dos ditadores. (i) Rubinho não vence porque é muito amigo de Schumacher. (i) Os pontos corridos no Campeonato Brasileiro vão moralizar de vez o futebol-penta. (i) Eu não namoro a Gisele Bündchen porque ela ronca.A vida será mais fácil depois que o Ponto de Ironia for adotado. (i) Os filmes ingleses serão finalmente compreendidos. (i) E tomara que os escrachados humoristas do Casseta & Planeta não venham com gracinhas e nem redijam algum manifesto em favor do humor imediato. (i) E assim, Luiz Fernando Verissimo, este escritor hermético, prolixo e reacionário, possa tomar o vinho que quiser, na hora em que quiser, comemorando o título roubado do Internacional na decisão da Copa do Brasil de 91 contra o Fluminense.(i) Aliás, se você gostou da novidade, envie um e-mail para promocaopontodeironiamercedes@pessoasdoseculopassado.com.br e concorra a um Classe A. Lembrando que promoção sem cedilha e til. A defesa mais veemente do novo ponto leva o carrão alemão.O problema da nova pontuação, como toda novidade que chega ao mercado, será o excesso do uso. O abuso. Afinal, será obrigatória a revisão de textos clássicos da humanidade. Quantos (i)s terão as novas versões da constituição brasileira, da Ilíada, do Leviatã, do Manual do Zé Carioca, dos Miseráveis, da Riqueza das Nações, de Hamlet, do hino do Olaria?Nem tantos.
(i) O problema mesmo serão os livros do Verissimo.
Plagiado de: http://www.pessoasdoseculopassado.com.br/interna.asp?sid=1&tid=287
Burning
Há 14 anos
Nenhum comentário:
Postar um comentário